terça-feira, 13 de abril de 2021

DE HERMES A TAT: DISCURSO UNIVERSAL Diálogo perdido IIB Título perdido - comentado - parte 3 (última)

 15 A amplitude do Bem é tão grande quanto a realidade de todos os seres e dos corpos, bem como dos incorpóreos, dos sensíveis e dos inteligíveis. Eis o que é o Bem, eis o que é Deus. Não chame nenhuma outra coisa de boa pois isto é impiedade, ou dê a Deus qualquer outro nome que esse único nome de Bem, pois isto também é uma impiedade. 

[Bem, em hermética, não é de forma alguma algo relativo, nem tampouco subjetivo, mas como está escrito, uma realidade de amplitude muito grande (talvez tão grande que esteja fora de nossa possibilidade de compreensão, a não ser parcial. Bem não é uma ação, fenômeno ou objeto que possa ser julgado ou medido por simples padrão de valor comparativo; é algo real em si mesmo (há exemplo de felicidade, que infantilmente os filósofos do oriente e do ocidente em sua maioria crêem um bem em si mesma, sendo que nesse caso bem é mesmo "bem em si mesmo"). Mas por ser de tal modo indizível o autor passa logo ao que pode ser dito e entendido facilmente, o que é o Bem: é Deus, e Deus é o bem, e nenhuma outra coisa, ou ser, ou fenômeno... Não poderíamos deixar de lembrar, com essa afirmação de Hermes, a resposta de Jesus ao homem que o chamou de bom mestre, "Por que me chamas bom? Ninguém há bom, senão um, que é Deus." E ainda o dito por Paulo "Não há um justo, nem um sequer. Nisso se referindo aos salmos que dizem "Desviaram-se todos, e juntamente se fizeram imundos; não há quem faça o bem, não, nem sequer um." O princípio é o mesmo. Em relação a Deus mesmo o "bem" que julgamos fazer não é bem, e pode até ser mal, pois provém normalmente da falsa persona, do chamado ego animal ou alma animal, ou ainda alma humana, contaminada, no máximo, difernte da alma divina. O único verdadeiro bem é Deus. Desviar-se de Deus é, portanto, desviar-se do bem, e dizer que outra coisa, para a qual desviamos, é boa, é a essência da impiedade. Dar a Deus nomes (diferentes de Bem e daquele por ele revelado) é impiedade. Com certeza isso é um duro golpe na religião egípcia da época e na idolatria faraônica (pois além de serem cultuados e cultuarem vários deuses, os faraós ainda vez por outra davam um nome ao Deus dos deuses igual aos de seus ídolos, para dizer que seu deus preferido naquele panteão seria o próprio Deus dos deuses), motivo pelo qual o hermetismo teve que se manter escondido da corte faraônica e da população em geral. Isso até que um faraó finalmente adotaria o monoteísmo de forma explícita (Akenaton). Mas também que logo foi reprimido e duramente suprimido por seus sucessores e assim apagados e perdidos quase todos os registros herméticos. Ficou assim apenas a cargo da verdadeira tradição e alguns manuscritos em língua grega a preservação dessa sabedoria, que infelizmente muitos hoje confundem e até impiamente misturam com a idolatria egípcia.] 

16 Certamente, todos pronunciam a palavra Bem, mas não percebem o que ela pode ser. Eis porque não percebem também o que é Deus, mas, por ignorância, chamam bons os deuses e certos homens, ainda que não o possam ser e nem se tornar: pois o Bem é o que menos se pode retirar de Deus, é inseparável de Deus, porque é o próprio Deus. 

[Nenhum ser, nem humano, nem deus algum pode ser considerado bom na hermética, nem sequer ser chamado de bom, se referindo a suposto bem relativo. Por isso muitos, ao conhecer o verdadeiro hermetismo e achando-o duro demais, voltam ao falso, cheio de superstições, idolatria e elementos da cultura egípcia que os herméticos daqueles tempo abominavam. Há até os que se curvamdiante de estatuetas da tumba de Ramsés ou de seu busto e se consideram herméticos! Ignoram que Ramsés foi um dos maiores perseguidores, senão o maior, do monoteísmo e também do hermetismo? No hermetismo, ao contrário da maioria das religiões, o bem de Deus é um atributo incomunicável, assim como sua eternidade, onisciência, onipotência, etc.. Apesar disso, como nas religiões monoteístas outros atributos, o amor, a compaixão, a sabedoria de Deus, etc., são comunicáveis, isto é, partilhados tanto com humanos, quanto com outros seres, inclusive os demais deuses criados primeiro, como veremos a seguir.]

Todos os outros deuses imortais são honrados com o nome de Deus.

[Ou seja, recebem dos atributos comunicáveis de Deus. "Com o nome", na liguagem antiga, especialmente na hebraica (um indicativo da origem da tradição), significa, com a pessoa, com seus traços, com seus atributos.]

Mas, Deus é o Bem, não por uma denominação honorífica mas pela sua natureza. Pois a natureza de Deus é apenas uma coisa, o Bem, e os dois juntamente formam uma única e mesma espécie, da qual saem todas as outras espécies. Pois o ser bom é aquele que tudo dá e nada recebe. Ora, Deus tudo dá e nada recebe. Deus é portanto o Bem e o Bem é Deus. 

[A natureza de Deus é o próprio Bem. Assim como para o grego o bom e o belo são uma única e mesma essência, e para o cristão o amor e o bem têm uma mesma essência em comum, Deus, para o hermético, o bem e Deus são uma única e mesma coisa. Assim como se costuma definir hoje que Deus é amor, se define em hermética que Deus é o Bem e o Bem é Deus. E todos os demais atributos desse emanam. Assim como na doutrina cristã Deus cria por amor aos seres queridos, a hermética ressalta o fato de que Deus cria porque criar é o bem para os seres queridos. E portanto, tudo que temos, que vemos, que sabemos, que somos, que podemos imaginar ser um bem, não vem de nós, nem de nenhuma outra fonte, senão de Deus. Além disso não há como alguém dar algo a Deus, mas Deus é eterno dador. Em nossa liberdade nós podemos fazer escolhas em harmonia com Deus ou em desarmonia, de Deus podemos obter o bem ou em oposição podemos nos abster do que é dado, o Bem. E podemos até produzir de nós mesmos o mal.]

17 A outra denominação de Deus é a de Pai, devido à virtude que possui de criar todas as coisas: pois é ao Pai que cabe o criar.

[As duas denominações de Deus então são Bem e Pai, pois que Deus não é nome. Mas nesse sentido temos Deus, Bem e Pai, diferente de pai, ou pais. Assim como o significado da palavra Deus é muito diferente do significado da palavra deus. Temos que Pai é criador (o verbo correto seria "crear", diferente de "criar", como aponta o filósofo Humberto Hohden), diferente do pai terreno, progenitor, que reproduz, e do criador de galinhas, por exemplo, que cria em outro sentido. Ele criou no sentido de inverntar e de dar existência a. Assim o Pai não é simplesmente um reprodutor, tampouco somente um construtor, ele é o único de fato criador, o "creador". Ainda dentro dessa perspectiva, Bem e Pai são substantivos próprios e intransferíveis, enquanto Deus e substantivo e adjetivo. Essa peculiaridade linguística do pensamento hermético não apenas mostra sua sofisticação, mas também sua intenção de demonstrar uma especificidade. Pois enquanto pai, bem e deus são palavras de grande amplitude em significados e muito gerais, Pai, Bem e Deus são muito específicas, não existe outro ser assim e se existir um ser tão grandioso, mas que lhe falte alguma dessas três, apenas digamos, facetas, não se trata do mesmo, não é Deus e portanto também não é Bem nem pode ser Pai, portanto é falso (o que mostra que o dito hermetismo, diferente do tradicional, moderno, todo inclusivo e medroso de desagradar, que diz que qualquer entendimento sobre o Ser Supremo trata do mesmo Deus, também é falso). 

Também a procriação das crianças é tida pelas pessoas sábias como a função mais importante da vida e a mais santa, e se vê o fato de um ser humano deixar a vida sem procriar como o maior infortúnio e o maior pecado, e um tal ser humano é punido depois da morte pelos daimons. Eis a pena a que é submetido: a alma do ser humano que morre sem filho é condenada a entrar em um corpo que não possui a natureza de homem, nem de mulher, o que é objeto de execração por parte do sol. Por esta razão, Aselépios, deves guardar-te de felicitar o ser humano que não possui filhos: contrariamente, apieda-te de sua infelicidade, sabendo qual o castigo que o espera. Mas isto basta, Asclépios, como conhecimento preliminar da natureza de todas as coisas.

[Note que a procriação de crianças é tida como a função mais importante da vida biológica e a mais santa, entendendo aqui ainda também dentro dos aspectos corporais (pois claro que as da vida espiritual são mais importantes, nem por isso esta, menos importante, seria dispensável, jamais!), e também a grande maioria das tradições vê o fato de um ser humano deixar a vida sem procriar como pecado, no Corpus Hermeticum diz que um tal ser assim é punido depois da morte pelos daimons; entre as milhares de religiões hindus se diz que é a maior desonra e que o homem só deve se tornar um samana, ou asceta, ou monge ou hermita depois de gerar e criar seus filhos; na cristã primitiva e na gnosis verdadeira a vida celibatária é um dom de Deus dado a muito poucos e só se deve tornar-se assim por este dom, ou viuvez, ou já tendo gerado família para seguir e se dedicar somente a Cristo; na kabalah os jovens se dão cedo em compromisso, cedo se casam e cedo tem seus filhos, os que se retiram da sociedade para a vida contemplativa levam suas famílias ou pelo menos um filho; no budismo autêntico só se pode tornar monge o filho que tenha permissão dos pais de interromper a cadeia familiar tendo mesmo assim deixado outro irmão já com filho ou pelo menos casado. Creio que com esses exemplos esclarecido fica esse ponto sobre o qual há tantas argumentações sem sentido hoje. O caso à parte dos templários e rosacruzes é ainda para ser pensado, mas os primeiros já eram monges antes de se tornar templários, tanto que o voto de castidade dos casados se refere apenas à sua fidelidade quando saia às batalhas ou longas viagens e serviços, e no caso dos segundos, muito provavelmente só aderiam a essa exigência os que já tinham o dom ou que já foram encontrados solteiros e castos e foram então longamente preparados para assumir uma vida celibatária definitiva. Note também que os que nascem sem definição são execrados pelo sol, ou seja, suas relações se dão às escondidas, pois não são aprováveis. Mas não é por isso que não se nota homossexuais no hermetismo verdadeiro, assim como na igreja, os homoafetivos são aceitos, mas sua prática de relacionamento afetivo e sexual não. Além disso o homoafetivo é ensinado a abrir mão da aparência do sexo oposto, portanto, ele não apenas se torna celibatário devido a seu nascimento (podendo por outro lado casar com seu sexo oposto e gerar filhos), mas também aprende a comportar-se conforme seu gênero genético. E com as práticas herméticas psíquicas isto é muito facil, diante outras transmutações psíquicas que todos devemos realizar, sendo das menores questões. Mas observe que isso não é um aspecto pequeno do ensinamento hermetico, um livro é concluído com esse esclarecimento. Aqui está um dos princípios herméticos: tudo tem gênero. Consequentemente, todos têm genero. O mais incrível é que chegamos num tempo onde é preciso explicar isso, pois não parece mais óbvio e natural, muitos não entendem, embotada que foi sua capacidade de percepção e raciocínio por conceitos e ideologias, de tal forma que tais entendimentos lhe convencem mais do que as próprias consciência, natureza e ciência verdadeira. Já para os demais a existência de tais assim nascidos não são de forma alguma motivo de escândalo, escárnio nem uma ofensa, pelo contrário, só mais um dos inúmeros fenômenos das manifestações humanas através do qual é chamado à piedade e à compreensão profunda. E sim, se a pessoa não quer mudar o castigo à espera, é isto mesmo que está escrito e pode ser visto pelo sobe às alturas além da esfera refletora (astral, região dos mortos, mundo dos sonhos, ou como se queira chamar).]

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