sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

DE HERMES A TAT: DISCURSO UNIVERSAL e Título perdido - comentado - parte 1

 IIA

DE HERMES A TAT: DISCURSO UNIVERSAL

Diálogo perdido

IIB

Título perdido

1 Todo móvel, Asclépios, não é movido em qualquer coisa e por qualquer coisa? - Seguramente. - E não é necessário que aquilo em que o móvel se move lhe seja maior? - É necessário. - O motor, que te parece, é mais forte que o móvel? - Mais forte, com efeito. - E isso no qual o móvel se move é necessariamente de uma natureza oposta àquela do móvel? - Sim, absolutamente.

[Aqui Hermes argumentará a Asclépios basicamente sobre a demonstração do motor imóvel primeiro, análoga à demonstração aristotélica. Todo o argumento aqui gira em torno das evidências de um cosmo criado contra a hipótese de um cosmo espontâneo, gerado por si mesmo. Tendo isso em mente fica fácil entender o porquê dos argumentos. Sendo que tudo está em movimento e todo movimento é gerado e ou mantido por alguma força, tem que haver uma primeira causa do movimento, o motor primeiro, que deve ser uma força oposta ao que vemos em movimento, e também mais forte.]

2 Agora, é tão grande este mundo que nenhum corpo não lhe possa ser maior? - De acordo. E ele é compacto? Pois está repleto de muitos outros grandes corpos, ou, para dizer melhor, de todos os corpos que existem. - É assim. - Ora, o mundo é precisamente um corpo? - É um corpo. - E um corpo que é movido? 3 - Seguramente. 

- Qual o tamanho que deve ter o lugar no qual o mundo se move e de que natureza?Não deve ser bem maior, para ter condições de conter o movimento contínuo do mundo e para que o móvel não seja comprimido pela estreiteza do lugar e não cesse assim seu movimento? -Ele deve ser qualquer coisa de imenso, oh! Trismegistos.

[Agora a demonstração de que se o imenso mundo se move maior deve ser o meio no qual está a mover-se...]

4 Mas de qual natureza será este lugar? Da natureza oposta, não é Asclépios? Ora a natureza oposta ao corpo é o incorpóreo. - Eu convenho. - O lugar será então incorpóreo. Mas o incorpóreo, é ou qualquer coisa de divino, isto é, não engendrado, ou bem é Deus.

[...E que este lugar tem que ser de natureza também diferente, no caso, incorpóreo, já que o mundo é corpóreo. Aborda também a antiga se esse incorpóreo não seria o eterno, não gerado, não criado, não engendrado, ou mesmo o próprio Deus, visto que é de natureza também oposta a corporeidade. Levantando também uma questão sobre a demonstração anterior, se o próprio local em que somos e nos movemos, isto é, no qual tudo se move, não seria ele próprio o causador, o motor.]

5 Se então o incorpóreo é o não engendrado, é da natureza da essência e se é Deus é ocorrente mesmo sem essência.

[Então levantam-se duas possíveis hipóteses a partir disso: se o incorpóreo onde o mundo se move é simplesmente o não engendrado, sem começo este incorpóreo é da mesma natureza da essência, ou seja, é o ente primordial; mas se o incorpóreo onde tudo se move é o próprio Deus não precisa de uma essência para ocorrer, pois não é contingente, dependente. A questão posta dessa maneira fica truncada, não pode ser respondida, porém...] 

Por outro lado é inteligível da seguinte maneira. Deus é para nós o primeiro objeto do pensamento, ainda que ele não seja objeto de pensamento para si mesmo (pois o objeto de pensamento cai sob os sentidos daquele que o pensa. Portanto Deus não é objeto de pensamento para si mesmo: pois não é uma coisa diferente do pensado de sorte que ele pensa a si mesmo. 6 Para nós contrariamente, Deus é alguma coisa de diferente e eis porque é objeto de pensamento para nós.) 

[Anterior a todas as causas é Deus, o primeiro, o primeiro objeto que encontramos através de nosso pensamento em busca da causa anterior. Mas para o próprio Deus o pensamento de Deus é idêntico ao próprio Deus (até porque ele conhece completamente a si mesmo, é onisciente). Enquanto para nós o pensamento de Deus é algo diferente (de nós e do próprio Deus mesmo). Assim...]

Ora, se o lugar é objeto de pensamento, não o é enquanto Deus, mas enquanto lugar. E mesmo se o tomarmos como Deus, não é enquanto lugar, mas enquanto energia capaz de conter todas as coisas. 

Todo móvel é movido não em qualquer coisa que se move, mas em qualquer coisa em repouso: o motor também está em repouso, pois não pode ser movido com aquilo que move.

[Agora aparentemente estamos diante de três objetos diferentes, o cosmo movido, o local imóvel onde este se move e o movente também imovel, o demais está claro e não será necessário explorar mais os dois trechos.]

- Como então, oh! Trismegistos, as coisas cá de baixo são movidas com as coisas que as movem? Eu te ouvi dizer, com efeito, que as esferas dos planetas são movidas pelas esferas das fixas. - Não se trata, Asclépios de um movimento solidário, mas de um movimento oposto: pois essas esferas não são movidas por um movimento uniforme, mas por movimentos opostos uns aos outros e esta oposição implica um ponto de equilíbrio fixo para o movimento: 7 pois a resistência é parada do movimento.

[O trecho parece indicar as relações de forças opostas como as que atraem os planetas para o centro, o sol, e as que repelem, fazendo com que girem. Mas essa noção pode não corresponder ao texto. De qualquer forma ele está a demonstrar que independente de as forças estarem em movimento ou uma imóvel e outras em movimento, seriam sempre ainda forças opostas.]

Assim então as esferas dos planetas sendo movidas em sentido contrário da esfera das fixas, 

[Por exeplo, se aqui esfera fixa for o sol, e móveis os planetas, os giros do sol seriam num sentido e os dos planetas no sentido oposto.]

encontram-se em oposição com a própria oposição, sendo movidas por ela como estacionária. E não poderia ser de outra forma. Deste modo estas duas Ursas que, como o vês, não possuem nem oriente nem ocidente, e que giram sempre em torno do mesmo centro, pensas que estão em movimento ou repouso? - Movem-se, oh! Trismegistos. - Com qual movimento, Asclépios? - Com o movimento que consiste sempre em girar em torno dos mesmos eixos. - Sim e o movimento circular não é nada mais que o movimento em torno de um mesmo centro firmemente contido pela imobilidade. Com efeito o movimento em torno de um mesmo centro exçlui a possibilidade de um movimento do eixo. De onde vem que o movimento em sentido contrário detém-se em um ponto fixo, pois tornou-se estacionário pelo movimento oposto.

[Um argumento não muito claro e talvez não preciso (pode também ser erro de traduções ou transcrições), mas de todo modo demonstra que o movimento de um astro não foi causado nem por outro nem por um movimento do eixo, o que se torna completamente correto se o  em relação a tudo mais que gira em torno (como o eixo de um planeta, imóvel apenas em relação ao próprio movimento em torno de si). Ele explica o que quer dizer com o exemplo a seguir:]

8 Eu vou to dar um exemplo na terra visível a olho nu. Veja os viventes perecíveis, o ser humano por exemplo, nadando. A água é arrastada pela sua corrente: mas a resistência dos pés e das mãos torna-se para o ser humano estabilidade, de modo que não é arrastado com a água. - Este exemplo é muito claro, oh! Trismegistos. Todo movimento então é feito numa imobilidade e por uma imobilidade. Assim então, o movimento do mundo, bem como de todo vivente material deve provir não de causas exteriores ao corpo mas interiores, operando de dentro para fora, quer seja dos inteligíveis, quer seja a alma ou o sopro ou qualquer outro incorpóreo. Pois um corpo não pode mover um corpo animado nem, de uma maneira geral, nenhuma espécie de corpo, mesmo se este corpo movido é inanimado.

[É facil notar, pelo raciocínio agora completo, porque ele quis demonstrar isso, para chegar na questão mais óbvia aos sentidos e à razão a demonstrando de maneira lógica: nenhum objeto que conhecemos move-se a si mesmo sozinho a não ser como no caso dos vivos em que algo em seu interior, seja a alma ou o sopro, isto é, o espírito, é que causa o movimento, ou seja, algo interior que comanda exterior.]

9 Como disseste aquilo, Trismegistos? As peças de madeira então, e as pedras e todas as outras coisas inanimadas, não são os corpos que os movem? - Não, Asclépios. Pois é o que se encontra dentro do corpo que é motor da coisa inanimada e não esse corpo mesmo, que move de uma só vez os dois corpos, o corpo daquele que porta e o corpo do que é portado: eis porque um inanimado não saberia movimentar um inanimado. Vês então a carga extrema da alma quando, sozinha, deve carregar dois corpos. Desta forma os objetos são movidos dentro de qualquer coisa e por qualquer coisa, é evidente.

[E aqui a conclusão irrefutável, já que o inanimado (sem ânima, sem alma) não poderia jamais mover-se e se há movimento no cosmo é óbvio que alguma outra coisa de natureza diferente da matéria movida é que o move. Ainda note a questão da dupla carga da alma, por isso nesta esta esfera não pode expressar toda sua capacidade, diante dessa ocupação dupla que é comandar dois corpos, o seu próprio, o corpo psíquico ou corpo da alma e o corpo denso ou corpo material com seus processos complexos e inúmeros, para a manutenção da vida biológica que é extremamente delicada e dependente desses inúmeros processos complexos.]

Continua...

segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

Grupo de Estudo das Ciências Antigas - O que é isso?

É o tipo de grupo que objetiva compartilhar nossos estudos e práticas para pessoas já previamente conhecidas e selecionadas, as que mostram alguma afinidade com nossas buscas e ou nossos estudos e nossa ética. Para nós é crescimento, não só em conhecimento, auto-conheciemento, descoberta de nossas capacidades e dificuldades, mas também de superação dos limites dos modos de conhecer (impostos pelos condicionamentos a que estamos submetidos nesse mundo, que nos impedem de ver, de saber, de compreender e de agir). É o superar de modo a trascender as limitações dos sentidos, da matéria, da consciência relativa e do conhecimento direto limitado, limitações que temos. 

Por tal oferecemos uma associação terapêutica, pois objetiva reestabelecer a psique (e consequentemente o corpo e a consciência) ao seu pleno estado de saúde e capacidades (intelectuais, cognitivas, emocionais, relacionais, etc.). A palavra terapia em seu real sentido dispensa qualquer adjetivo no sentido de sua completude sistêmica e abrangência, pois ela sempre se dirige ao todo do ser (consciência, psique e matéria) e suas relações com as outras partes do todo.

Mas o objetivo central dos grupos de estudo das ciências antigas (G.E.C.A.) é o conhecimento da verdade, portanto dos meios para chegar a ela diretamente. Não existe uma verdade contada por outros, isto seria apenas uma descrição, ainda de visão pessoal ou de conhecimentos, de um pontonde vista; a verdade tem que ser vista, por cada um, conhecida assim, por compreensão e experiência própria, vivida. Esse é o objetivo que norteia todo o percurso.

É preciso ainda esclarecer que nosso modelo de estudo não pode ser confundido com ocultismo nem religião principalmente, nem também esoterismo, nem filosofia, nem escola de pensamento, da maneira como são entendidas hoje estas palavras. Somos fundamentados numa outra base, diferente disso, uma base tripla, ciência, tradição e conhecimento direto. As ciências antigas e tradicionais (e suas atualizações por parte de todas as ciências, incluindo as transcendentais), a tradição herdada e mantida (várias tradições, das quais mantemos as boas e eficientes), e conheciemnto direto, que é experiência e compreensão direta de cada um (sejam elas partidas de treino, esforço, práticas ou atitudes ou sejam elas reveladas, advindas, místicas ou espontâneas). Os dois primeiros fundamentos partem daqui para o desconhecido e o último vem do alto para cá (ou como diz um ditado: de um lado "os homens procurando Deus" e do outro "Deus vindo revelar-se aos homens"). Podemos, simplificando exageradamente, dizer que através de algumas ciências e tradições aprendemos a nos por em contato com as leis e realidades universais e as trancendentais, e a partir disso ensinamos, ou ainda do mesmo modo dizer em verdade que se trata de uma ciência trazida a nós do Altíssimo, que nos pôs em contato com estas realidades e leis. A palavra Ordem, quando a usamos tem o sentido original, portanto não somos uma ordem, somos a ordem porque fazemos parte da Ordem (outras ordens, religiões, escolas, filosofias, tradições também podem fazer parte ou não dela), algo inalterável, aquilo que precisa ser visto, entendido e realizado, a verdadeira ordem de tudo. Quer conhecer mais? Então: venha e veja.


frateriliv@gmail.com

domingo, 10 de janeiro de 2021

O.I.T.O. - A Ordem - O terceiro ciclo

Você poderá ver ou já ter visto uma representação do cosmo, em livros das ciências antigas, não apenas como um 8, ou seja, um círculo superior sobre um círculo inferior representando o mundo da ordem e o mundo do caos e ordem, mas também um terceiro círculo abaixo representando a região inferior de puro caos. 

Antes preciso lembrar que os círculos não ocupam diferentes lugares como no gráfico, mas que se interpenetram, porém, não se tocam, são esferas diferentes, ou planos diferentes, ou as chamadas dimensões com suas subdimensões como se diz no coloquial. O círculo inferior, daí a palavra inferno, local inferior, é o mais denso e mais inescapável, porque não há concatenação aí, não há lógica nem consecução de causalidade lógica. Portanto, nada que se faça pode resultar em saída dali. Mas não é por isso que as pessoas ficam presas ao círculo inferior. É porque querem! Explico.

Primeiro liga-se ao inferno por afinidade, por pura sintonia, a mente está constantemente ou boa parte do tempo vibrando nos mesmos padrões daquela região. Por exemplo sentimentos de ódio, inveja, extrema cobiça ou luxúria, desejos sedentos, paixões vorazes, taras, pensamentos criminosos, atitudes anti-naturais, amor pela ignorância ou embriaguez ou topor, abuso, extrema preguiça, etc., são atitudes mentais antes de mais nada, e estas todas, e muitas outras, estão em sintonia com aquela região de vibração densa e caótica que não alcança jamais os padrões de ondas acima (enquanto a pessoa está aqui ela pode mudar isso, lá não). 

Mas acima de tudo a pessoa chega a um ponto que ela ama tudo aquilo, ela sente prazer, como o guerreiro que vai à batalha, não pela vitória e pela paz que esta conquistará, mas porque ama matar, ver sangue, ser cruel, abusar, mutilar, estuprar ou outras barbaridades, maiores ou menores. Como o ganancioso que sempre quer mais, esta ganância se ampliará para tudo que se encontra em seu novo pesadelo, a vida na região inferior.

O que acontece é algo crucial, a pessoa sente prazer na dor aqui, neste mundo, por exemplo, seja em si ou em outros ou em ambos: é uma séria candidata a uma estada permanente na região onde só terá isto, dor. Os que amam o sofrimento, sofrem, mas têm apego ao sofrimento, querem ver, sentir, continuar, os masoquistas, os sádicos... São todos tipos que nos mostram bem a prisão psíquica da região inferior. A pessoa não pensa em sair de lá, não quer, não imagina, ela quer resolver os problemas de lá, exatamente como nós aqui, distraídos com a vida neste mundo e nossos problemas, não queremos sair daqui! Não queremos ir para a região superior e deixar tudo aqui, não queremos ir para o céu agora, normalmente queremos ficar nesse mundo e prorrogarmos ao máximo a nossa partida. Se fosse oferecido a nós a vida eterna neste mundo muitos ficariam! Bem assim é no inferno. Eles querem se livrar dos seus problemas lá, mas não querem sair de lá, eles estão distraídos com seu pesadelo o suficiente para pensar que aquele mundo é tudo. Eles estão como nós num sonho, em lugares que reconhecem mesmo sem ter estado nunca lá, porque para eles tudo aquilo é muito familiar, é intimo, se encaixa perfeitamente ao que eles são: estão entregues à sua própria natureza interior cultivada ao longo da vida. 

Portanto, estas atitudes perante a vida são cruciais: viver só para este mundo, esta vida, o aqui-agora e os problemas e prazeres desse mundo, a matéria ou viver como um ser eterno, em passagem por esse mundo, viver para o eterno e para as coisas celestiais, superiores, eternas, o espírito, o transcendente; amar esse modo de vida com prazer e dor, lutas, e sentir prazer na dor e na luta, ou amar a vida autêntica, plena, original, consciente, celestial, e a paz, a liberdade e libertação da dor, dos sofrimentos e limitações desse mundo (se é que ainda resta alguma reminiscência, intuição ou esperança disto).

Assim, por mais que para os já habitantes da região inferior a dor e o sofrimento sejam enormes e eles queiram se livrar disso, querendo mesmo até não existir mais, isso não é possível, pois momento a momento eles têm a mesma natureza e os mesmos sentimentos que despertam todo tempo. O que odiava, odeia mais e mais, o que desejava, deseja agora a cada instante mais e mais. E isto mesmo os prende e os castiga em sua verdadeira natureza, isto é, a verdadeira natureza desses desejos. 

Eles não conseguem deixar de ser assim lá, pelo contrário, é tudo que eles têm, estão entregues a si mesmos, só têm a si próprios, o que eles mais amaram e mais quiseram quando passaram por aqui. Eles estão presos no que eles mesmos se tornaram por livre escolha. Sentido tudo aquilo completo em toda sua sequência e amplificado, como sempre desejaram. Por isso alguns dizem que a condenação é sempre a auto-condenação. O inferno, a região inferior, o caos, não pode tocar a ordem, por sua propria natureza. Assim também a mente daqueles habitantes de lá, que aqui experimentaram caos e ordem e escolheram o caos, e rejeitaram a ordem. Caos e ordem estão aqui, mas temos escolha. Algumas vezes até, o caos pode imperar, mas o pior está reservado para os que rejeitam a ordem.