segunda-feira, 23 de novembro de 2020

ORDEM E ESCOLA - Escola e Tradição

 

Como isso acontece? 


As imagens, idéias, impressões que se tem a respeito, são quase todas erradas e incompletas, claro. Eu mesmo tinha, já sendo graduado, muitas impressões erradas! 


As ciências antigas não são como as contemporâneas. Você não aprende por informações "verborrágicas" na confiança pura, praticamente, como se faz na universidade (onde os professores e livros são autoridades e artigos de fé), você, pelo contrário, é levado a questionar, a duvidar, a querer ver, você não é levado a se dar por satisfeito diante de explicações manipuladoras, como no mundo acadêmico ou no mundo ocultista (infelizmente a cultura do ocultismo e da nova-era se aproveitam das informações das ciências antigas para fazer justamente o mesmo, isto é, apresenta-las como doutrinas para justificar suas posturas, práticas e dogmas absurdos). Nas ciências antigas se uma pessoa for do tipo que se convence rápido e se conforma terá que ser levado a ver que não sabe nada daquilo que pensa que sabe. Não é porque muitas informações são passados que vai se sentir bem, e sim porque se depara com sua própria e imensa ignorância e vai querer os meios para sair dela. 


Nessa escola surgiu a filosofia, a psicologia, a ciência, a medicina, a epistemologia, a alquimia, a matemática, a física e até a música enquanto ciência e sistema linguístico e estético. Não existe um pensamento fixo, obrigatório, mas um método, uma prática para levar a uma vivência. E é a transmissão desse método que a escola carrega a princípio.


O método 


Esse método é muito extenso para ser descrito num pequeno texto, mas basicamente consiste em conhecer o conhecedor e o processo do conhecer primeiro; conhecer o que valida o conhecimento primeiro, antes de patir para os conhecimentos, conhecer o conhecedor e seu processo de conhecer. Isto é chamado para uns de epistemologia, a ciência do conhecimento, mas tradicionalmente de despertar, pois é essa a sensação que se tem. Quando se começa a conhecer, a vivenciar em si esse processo de conhecer o conhecedor a pessoa sente como se nunca tivesse vivido antes, como se estivesse sonhando antes, como se nunca tivesse de fato vivido. A pessoa percebe que nunca conheceu realmente, que apenas memorizou informações através dos sentidos e entendimentos dos outros... Mas também essa ciência é chamada de ontolgia por outros, a ciência do ser e das origens do ser, da causa primeira, etc.. Mas nós chamamos tradicionalmente de metafísica, porque não para nisso. Ontologia é apenas uma parte dessa ciência. Nós chamamos metafísica porque inclui tudo, é o estudo de tudo, de suas causas e origens, e de suas consequências e propósitos. Que passa pelo que é fisico e pelo que está além da fisis, além até dos sentidos e do que aparelhos podem aferir. 


Por isso essa é uma tradição que engloba muitas tradições e os resultados de todas as outras ciências. Assim como a mente é o sentido receptor de todos os outros sentidos e a processadora de todas as suas informações, a metafísica é a receptora de todas as ciências e processadora de todas as sua relações e informações. Mas também assim como na mente encontramos um processo que não é dela, mas no qual ela está se preocessando, a consciência, a metafísica tem nela um processo que não advem dela, mas no qual ela está contida, a visão da verdade, ou a verdade em si mesma.


Assim fica claro que não é também uma ciência do auto-conhecimento como uns dizem, numa perspectiva muito reducionista, que divide o universo em uma categorização existencial absurda: eu e o universo, ou o que existe dentro e o que existe fora de mim, como se a cada nascimento algo separado de tudo o que existe surgisse dentro desse tudo. Ao contrário essa é uma das primeiras dificuldades com que se depara o ensino dessa ciência, fazer com que a pessoa perceba que toda e qualquer coisa que ela chame de realidade está de fato sempre em alguma consciência, e que a consciência não é um reprodutor interno de imagens externas como faz a mente em seu rememorar. Mas tão logo a pessoa percebe isto (e depois também que já sabe distinguir bem sua mente de sua consciência e de seus conteúdos) ela se torna apta a usar o instrumento do conhecimento, o conhecedor verdadeiro, a consciência, de maneira a obter, não apenas o conhecimento de si mesmo, mas de qualquer coisa que queira saber, descobrir o que é a verdade e a verdade de qualquer conhecimento e os métodos de se obter conhecimento seguro. 


O verdadeiro conhecedor é a consciência. E existem maneiras de obter consciência sobre os objetos da consciência, isto mesmo é conhecer. Os conhecimentos são os objetos da consciência, mas a consciência em si também é objeto de conhecimento, não há duvidas sobre isso. Assim não há divisão entre conhecer a verdade, e conhecer o que está fora ou que está dentro de mim. As ciências normais dificilmente incluirão o conhecedor em suas investigações e seus métodos (nem tampouco como processador e modificador do objeto, isto é do conhecido), elas partem em seu ensino do ponto da informação pronta em si mesma, como se ela fosse auto-existente, ensimesmada, isso é um erro. Claro que é util e a depender do propósito daquele conhecimento ou daquela ciência não faz sentido discutir se aquele conhecimento se refere a uma realidade ou não, mas quando partimos para o campo do transcendente, para a metafísica, este ponto é fundamental, pois em muitos casos a consciência individual é a única testemunha do observado, não podendo compartilhar, demonstrar, mostrar a outra consciência o conhecimento e às vezes nem mesmo descrever ou explicar. 


Portanto, muito mais que nas ciências naturais são necessários métodos muito mais criteriosos, muito bem elaborados para atestar,  confirmar, ou refutar o que é experimentado (ao contrário do ocultismo que muitas vezes até confia na experiência única de uma única pessoa, um tal mestre ou outro titulo que se dê). E esses critérios e experiementos só puderam ser desenvolvidos  por causa também de um estudo e conhecimento muito aprofundado da mente e da consciência e de suas características, potencialidades e funcionamento. E é nesse sentido que essa também obrigatoriamente se torna uma ciência do próprio ser no qual está presente o conhecedor, a consciência. Mas embora isto seja um fundamento indispensável, é apenas uma etapa inicial dessa ciência, que seguirá se rofundando ao longo da experiência da pessoa, mas que a verdadeira ciência não pode se restrigir a isso. Também não pode se abrir tao amplamente ao estudo de qualquer coisa, não há tempo para isso, existe, portanto, um conteúdo de conhecimento, numa sequência, a ser tomado pela consciência no sentido da verdade completa e mais ampla, possível a esta consciência, da realidade.


Então se fossemos definir em todo seu processo de evolução, tradições e escolas, a metafísica poderia ser vista enquanto "ciência humana" que parte do conhecido para o desconhecido e enquanto dom divino que parte do para nós desconhecido rumo ao nosso conhecimento limitado. Por um lado ela é do humano transitório para o ser em si, eterno, infinito; mas por outro ela parte do próprio supremo ser, eterno, para se revelar em nós e nos despertar para o infinito eterno que não estamos acessando geralmente. É claro que tal ciência revela muitas coisas além do que procuramos sabem, é claro que estudá-la e praticá-la transforma muito as pessoas (ao ponto de parecerem sábias para uns e loucas para outros, claro). 


A tradição


Muitos dizem, "não creio porque sou cético" e não percebem o absurdo da frase. Eu digo "sou cético, por isso creio". Claro! Ao cético não resta nada, nenhuma alternativa, senão crer. Mas muitos jamais chegam, infelizmente, a perceber o óbvio. Do mesmo modo essa ciência (que na fraternidade temos chamado por nomes diversos, como iluminacionismo, despertalogia, metapsicologia, etc.) leva, ao oposto do que o analista superficial pensa, não ao saber (no sentido de conhecer comum, ter informação, testemunhar através dos sentidos, etc.), mas a se tornar, a ser...


Outras ciências não transformam as pessoas, na verdade não observam ou não admitem que transformam (até porque tal transformação completamente não planejada nem cuidada pode ser tanto boa para uns como desastrosa para outros). Nossa ciência não apenas transforma, ela é planejada e dirigida para certas transformações (por isso mesmo indentificada como alquimia psíquica ou alquimia espiritual). Saber e aprender é sempre se transformar, mas geralmente de modo inconsciente. Aqui não, a transformação é consciente, escolhida, intencional e planejada para certos objetivos: conhecimento (despertar) da própria consciência e suas potencialidades, expansão do conhecimento (da consciência e do conteúdo da consciência) pelo menos até a fronteira do possível para a consciência humana e conhecimento íntimo da fonte da consciência (a onisciência absoluta, o supremo Ser, o próprio Deus), sua origem, seu propósito e como alcaçar esse propósito e atingir esse retorno ao original (iluminação espiritual reintegração consciencial). Por isso e por todos os pormenores que esse processo envolve historicamente e por necessidade absoluta ela tem que estar ligada a tradições. Para que preserve princípio éticos e morais, segurança pessoal e dos afetados exteriormente, e padrões já atestados de segurança, eficácia e confiabilidade, entre outras necessidades.


Nisso o conhecer passa de um objetivo para apenas um método. E um efeito colateral é conhecer mais e com muito mais amplitude. Ao conhecer a pessoa se transforma e ao se transformar ela conhece profundamente, num processo retroalimentativo até o fim objetivado...