sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

O Grau Rosacruz -parte 4

No passado houveram três meios cogitados para a salvação, eles são modernamente chamados de via do cultivo da personalidade, via da separação da personalidade e via da união à divindade.

O primeiro pode ser equiparado ao cultivo do eu, ou cultura do eu. Foi o caminho dos filósofos (da via da razão) e dos yogins (ou via a partir do corpo).

O segundo é confundido com o "negue-se a si mesmo", mas não é esse. Separação da personalidade é, para uma parte, a negação do eu, é afirmar que o eu não existe, é abandonar a falsa idéia de eu, etc.. Este foi o caminho seguido por muitos yogins também, incluindo os budistas, alguns taoístas, os jainistas, e também foi seguido pelos empiristas, incluindo alguns taoístas, etc.. Mas esta separação também podia ser mecânica, isto é, não negava a existência de um eu na pessoa, mas propunha a separação dele, deixando o corpo e tudo relacionado à matéria, e indo ligar-se a um "Eu real", ou uno ou absoluto etc., ou simplesmente atingindo "o nirvana", para estes, um estado de "não-eu". Esta via foi seguida também por muitos desses citados, incluindo os ascetas e faquires. Ou ainda podia ser, para outra parte, vista como um meio de, deixando o corpo material, em um corpo espiritual, ou mental, etc., ir às dimensões superiores. Os hermetistas e outros ainda também utilizaram essa via.

É óbvio que esses caminhos não tem relação lógica com salvar-se e de fato não podem salvar a pessoa da existência nesse mundo baixo, da decadência, nem dos níveis mais inferiores ainda que esse (mas não cabe aqui discutir isso agora, nem as evidências dessa obviedade). Todos eles foram e são bastante úteis como meios de atingir certos conhecimentos. Tanto que uns são utilizados pela psicologia,  por exemplo, até hoje, de outras formas,  mas se trata exatamente da mesma coisa, separação do engano de um falso eu e ou, muito mais comumente, cultivo do eu ou da personalidade. E isto tem tido sua utilidade nas patologias e até certo ponto no geral também. Ainda podemos encontrar a ferramenta hermética utilizada em alguns campos da ciência, na parapsicologia por exemplo, e muitas ordens se utilizam disso como modo de obter experiências  (ainda que suas interpretações sejam erradas e incompletas) que leva, a ter consciência de dimensões mentais e as vezes até espirituais. Enfim todos esses meios ainda são usados para objetivos diferentes, mas sabemos que não nos leva à salvação, à libertação, à iluminação...

O terceiro talvez seja o mais simples e famoso, que é unindo-se o eu e ou a personalidade a divindades através basicamente do culto a elas, feito de várias formas. Essa via é usada por muitos como alguns xamânicos; os paganistas, politeístas, animistas, panteístas, etc.; as religiões antigas como da Grécia antiga, Roma, Esparta, Egito, Congo, e em toda África, Índia, Mongólia e China, na verdade, também pelos famosos astecas,  maias, etc.. Os livros filosóficos mais antigos da Índia já advertiam "você se unirá a tudo aquilo que ama [ou adora] e presta culto" e por isso há o mandamento "somente ao Senhor teu Deus adorarás e somente a ele prestarás culto". Não é uma exigência egocêntrica de Deus, é o modo dado pelo eterno para livrar-nos do mal de, por engano ou má consciência, nos ligarmos a ídolos, falsos deuses, espíritos impuros, etc.. 
Já nesse caso é claro que não passa de um grande e terrivel engano, que no máximo pode servir nesta vida como um tipo de cultura da personalidade, por exemplo. É muito óbvio para nós aqui que estes meios são, em suas esmagadora maioria, dirigidas para "divindades" erradas, gerando não apenas enganação, mas ao seu fim, condenação. De forma alguma poderiam gerar qualquer libertação, pelo contrário, só aumentam as obrigações inúteis que distraem e que ligam a pessoa a esse mundo e ao teatro que estão representando sem saber e finalmente à mesma dimensão inferior a que estes espíritos estão indo invariavelmente.

Estes meios ainda que no passado pudessem conduzir à  libertação (e de fato não podiam) hoje estão mais do que obsoletos. Pois o ser humano tem degenerado, corporalmente, psíquicamente e espiritualmente a tal ponto que não pode produzir de si coisa alguma, nada pode ser produzido por força própria do ser humano em questões espirituais,  absolutamente nada, o ser humano é completamente impotente em relação a seu espírito e alma (onde mesmo os poucos resultados sao temporais e exigem muito esforço  e superação) no que tange à eternidade e ao pleno conhecimento da verdade. O ser humano mal consegue por sua vontade e esforços permanecer consciente, atento, alguns minutos no presente apenas, sua mente por si só vai a mil lugares; suas emoções também não estão sequer parcialmente sob seu controle, é tão reativo como qualquer outro animal; não pode sequer ficar consciente nos sonhos sempre que queira, nem sequer lembrar o que quer, na hora que quer,  informações que estão ali em sua mente, mas ela as libera segundo suas próprias regras, o eu não tem controle senão temporário ínfimo,  sobre tudo isso. Imagine, se nós não podemos manter nossa consciência nem no sono, o que garante que a manteremos ou que despertaremos mais ainda depois da morte? O que garante que ela estará onde queremos que esteja, que veremos e vivenciaremos o que esperamos.? É preciso uma força realmente espiritual, que tenha o poder, só o que é espiritual pode atuar no espírito, o resto é engano.

Mas existe uma quarta via, que até utilizou, historicamente falando, em alguns momentos, essas outras, mas mais para beneficiar os que nela se encontravam. Nesta via o eu (não importa se seja considerado transitório ou essencial) é transformado de forma correta, ou seja, de volta aos padrões originais, da natureza original, não da decadente, isto é, não dessa natureza mortal. Ela é chamada de via trasfigurística por alguns ou via da transmutação por outros. É a via alquímica. E aqui sim, agora temos a via do "negue-se a si mesmo", pois não é simplesmente a negação do eu não tendo um substituto, uma realidade para colocar no seu lugar; não é uma afirmação de que o eu não existe, é dizer o que é que existe, o que é que ocupa legitimamente esse lugar, no retorno à natureza original, na cura humana.

Nós não siplesmente expulsamos o eu ou o negamos. Nós o deslocamos, colocamos no seu lugar, que é a cruz. Mas não por nosso esforços, não por nossas mãos, e sim através da aceitação, recepção, crescimento e desenvolvimento do real, do eterno em nós, que é Cristo em nós, que é o botão de rosa que vai desabrochando em nós. Onde? Na cruz. O eu vai para seu devido lugar, que é na cruz, e o eu é nossa cruz, Cristo é a rosa. O eu é crucificado, mas quem faz essa obra é Cristo em nós, nós não temos capacidade de irmos para a crucificação, nós apenas tomamos a nossa cruz e seguimos a Cristo negando a nós mesmos,  como ele fez, e o Cristo gradualmente tomará o lugar do eu. Esse é o processo trasfigurístico da rosacruz verdadeira, chamado transmutacão alquímica. É assim o processo. Pois "ele deve crescer e eu devo diminuir", até  que "não viva mais eu mas Cristo viva em mim", e que "Cristo seja tudo em todos"...

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